Dois irmãos que nasceram na Bunhosa, Montemor-o-Velho: Manuel e José Gomes, decidiram, quando tinham respetivamente 35 e 32 anos, tentar a sua sorte no Brasil. Sendo agricultores, viviam na pobreza e, por isso saíram da sua terra e foram ter a uma cidade no Brasil que se chamava Bebedouro. Dali foram para uma terra chamada Barretos onde encontraram um conterrâneo seu de Portomar chamado José Maranhão. (fundador da Igreja Presbiteriana de Portomar). Tornaram-se amigos e começaram os 3 a frequentar uma igreja evangélica. Embora trabalhassem duramente como madeireiros durante muitas horas, 6 dias por semana, nunca faltavam ao culto dominical e, no dia 12 de outubro de 1928, José Maranhão Neves e Manuel Gomes foram recebidos como membros da igreja Presbiteriana de Barretos e José Gomes foi Batizado um ano mais tarde.
Em finais de 1930 os 2 irmãos regressam a Portugal. Sem fortuna, pobres como saíram, mas mudados por dentro. Os 2 dizem a quem quer ouvir que voltavam pobres, mas com a maior fortuna que se pode encontrar: A salvação. E quiseram partilhar com todos o seu tesouro. As pessoas achavam-nos descarados, desbocados e insistentes. Mas os dois irmãos não se cansavam de anunciar a nova lei e as pessoas ficaram muito surpreendidas, porque os dois homens tinham voltado modificados: o seu carácter, os seus modos, os seus interesses tinham mudado. Às quartas-feiras, Manuel Gomes depois de muitas horas de trabalho duro no campo juntava os seus amigos e família na sua casa e iluminado por um candeeiro de petróleo, lia a bíblia, orava e explicava os textos bíblicos à luz da sua fé.
Sem grande instrução e nenhuma formação de seminário ou escola bíblica ele falava apenas do seu amor por Deus e dava testemunho da sua vida. Foi o bastante para revolucionar as terras do Bebedouro, que nunca mais foram as mesmas. As circunstâncias da sua vida continuavam iguais: pobres agricultores que trabalhavam de sol a sol, mas algo tinha mudado no seu modo de olhar o mundo.
Dois anos após a volta de Manuel Gomes do Brasil, em 1932, três pessoas convertem-se a esta nova fé. Estavam lançados os alicerces da futura igreja do Bebedouro. Nos anos seguintes, reunindo-se a Igreja, ainda na sala do Sr. Manuel Gomes, foram batizadas 32 pessoas: Lavradores, agricultores e jornaleiros. Perseguidos, rejeitados e ostracizados até por familiares próximos, o pequeno grupo continuava firme. Germinava o sonho da construção de um templo. O terreno foi doado por Joaquim Teixeira, os membros quotizaram-se, muitas ofertas em dinheiro eram compromissos de oferecer o fruto de um dia de trabalho, muitos dos materiais eram oferecidos pelos crentes e de algumas igrejas irmãs vieram ofertas significativas. Grande parte do crentes do Bebedouro, não tinham mais nada de seu do que esta nova fé, mas no dia 14 de agosto de 1938 foi lançada a 1ª pedra e, a publicação protestante “Portugal Novo” afirmava que estavam presentes mais de 1000 pessoas. Depois de muitas vicissitudes e histórias de dedicação, sacrifício e generosidade às 15h00 do dia 8 de dezembro de em 1940 foi solenemente inaugurado o templo do Bebedouro
Pastorearam esta comunidade os pastores Pascoal Pitta, Paul Vallon, Natanael Emmerich, Teodoro Augusto Silva, Saúl de Sousa, João Neto, Mário Neves, José Manuel Leite, Jorge Gameiro, Manuel Pedro Cardoso e, presentemente Maria Eduarda Titosse. Serviram também esta comunidade, os evangelistas Isac Rodrigues Aço e José Maria Simões Serafim. Esta é comunidade desde sempre deu muita importância à formação e estudo, muitos foram e são os diáconos, presbíteros e pregadores leigos, professores de Escola Dominical que com fidelidade e dedicação asseguraram o funcionamento dos cultos, na ausência dos pastores e regularmente os Estudos Bíblicos e Escola Dominical.
Nos anos 60, o pastor Mário Neves, percebendo a vida difícil e sem apoios que tinham os agricultores da zona, teve a ideia de criar o Fundo de Crédito Agrícola e, na reunião do Conselho da Comunidade de julho de 1963, foram apresentadas as linhas gerais da futura Cooperativa Agrícola do Bebedouro, num documento chamado: “Fundo de Auxílio Rural.” O projecto germinou, foi construído e apoiado com fundos das igrejas irmãs da Europa e, a 3 de março de 1968, já com a liderança do pastor José Manuel Leite será inaugurada a Cooperativa Agrícola do Bebedouro.
Esta comunidade resiliente e fiel, foi uma comunidade missionária, abriu as missões de Tocha, Ermida, Moita Vaqueira (já encerradas) e, apoiou a missão de Portomar, que desde 2011 tem o estatuto de Igreja. Foi também uma comunidade pioneira no movimento ecuménico em Portugal pois, para além das Celebrações da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos e do Dia Mundial de Oração, manteve por muitos anos estudos bíblicos semanais ecuménicos.
A Igreja do Bebedouro é uma igreja viva, relevante e interventiva na vida da freguesia onde se insere. O templo e demais instalações são furto de muito trabalho e dedicação dos seus membros que com as suas próprias mãos e fundos próprios foram cuidando e construindo esta Igreja. O templo, o salão social, as salas de Escola Dominical foram muitas vezes construídas à luz de candeeiros de petróleo e com mão de obra dos próprios crentes.
A Igreja do Bebedouro é um sinal de esperança e cumprimento de promessas e, tem sido ao longo dos tempos um local de apoio formativo: Muitas crianças e jovens puderam estudar e mudar ciclos de pobreza e discriminação. Foi, desde sempre um bastião de empoderamento feminino, da defesa dos direitos das crianças e adolescentes e proteção dos mais velhos. Aqui a Palavra de Deus mostrou-se transformadora e criadora de novas realidades.
Hoje a Igreja do Bebedouro é uma ativa, que acolhe quem a visita e tem sempre na sua agenda tempos de encontro, de partilha e de anúncio das Boas Novas que transformaram uma aldeia remota, num local de referência da história do protestantismo em Portugal.
Sejam bem-vindos!
CARDOSO, Manuel Pedro. (2000). Bebedouro, o Protestantismo no mundo rural.
CARDOSO, Manuel Pedro. (2001). 1901-2001: Um século na Figueira da Foz.
ver menos